terça-feira, 8 de junho de 2010
A urbanidade: uma forma de medir a qualidade das cidade
quarta-feira, 14 de abril de 2010
A identidade geográfica e o presente
Jaime Oliva
Geografia dos cheiros
domingo, 28 de março de 2010
O Grande Rio
sábado, 27 de março de 2010
A indústria de suínos: o fim do rural
sexta-feira, 19 de março de 2010
Galinhas também são gente?
Jaime Oliva
domingo, 14 de março de 2010
A WEB e o espaço geográfico: analogias
Jaime Oliva
Como forma de investigação sobre o funcionamento e o significado da WEB e da rede Internet algumas analogias com o espaço geográfico podem ser feitas. Do mesmo modo, compreender como essa tecnologia muda nossas vidas e passa a compor, de certo modo, o espaço geográfico é uma reflexão que não pode deixar de ser feita.
O ciberespaço pode dar visibilidade a empreendimentos pequenos – é uma outra plataforma de onde se empreende novas relações entre os seres humanos e de extraordinária eficiência, mudando nossas relações com a distância. Nele se atua em várias escalas – desde o plano local, quanto mundial. Nele coloca-se em contato pessoas diretamente (uma presença de corpos ausentes).
sábado, 13 de março de 2010
Geografia e epidemias
Jaime Oliva
Algumas das grandes epidemias que vitimaram grandes contingentes de seres humanos têm em seus nomes uma dimensão geográfica: gripe espanhola, gripe asiática, por exemplo. Isso não é mera curiosidade e tem, na verdade, muitas implicações.
É possível mostrar mais detalhadamente essa relação entre a expansão de doenças e o espaço geográfico: os seres humanos convivem com microorganismos, mas a cada novo território que ele usa e transforma mais microorganismos são introduzidos nessas relações. Para muitos desses microorganismos e suas mutações o corpo humano já adquiriu defesa, contudo quem ainda não entrou em contato com alguns desses microorganismos não possui essa defesa. Isso explica porque muitos microorganismos que os brancos colonizadores trouxeram para a América e que para estes eram inofensivos foram tão letais para as populações indígenas. O que não quer dizer que não existam microorganismos para os quais o corpo humano não tenha defesa. Para alguns não há tempo e por isso desenvolveram-se fórmulas de criar essa defesa artificialmente. Entre uma dessas defesas está a geográfica.O que são as defesas geográficas contra a ação nefasta dos microorganismos: para melhor entendimento dois conceitos são chaves, são eles: endemia e epidemia. Endemia refere-se à doenças provenientes de microorganismos que estão circunscritas a determinadas porções do território.
A febre amarela é um exemplo: ela está presente apenas em algumas regiões. Só são contaminados aqueles que vão para aquela área, porque os agentes transmissores estão ali situados e dificilmente conseguem migrar. Esse é o caso também da malária (ou paludismo, maleita).
Essa terrível doença ataca muitas pessoas no planeta mas ela é endêmica a algumas regiões: no Brasil sua mais importante manifestação é no norte do país onde há muitas regiões florestadas e abundância de cursos d’água, já na África, praticamente o continente todo possui zonas de malárias. São tantos os locais de endemia da doença, que ela transita para a situação de epidemia. O que é epidemia: é quando doenças transmitidas por microorganismos extrapolam territórios circunscritos e começam a contaminar pessoas em vários lugares. Isso quer dizer que o agente transmissor migrou da área original de contaminação de modo descontrolado. Em geral isso acontece quando o agente transmissor é o próprio homem. Esse é o exemplo das gripe espanhola que chegou ao Brasil e de muitas outras epidemias, como por exemplo a AIDS. Quer dizer a epidemia é a proliferação de doenças que deixam de ter como referência o território geográfico estático e passa a ter relação com os fluxos, os movimentos migratórios, as redes geográficas.Visto essas duas diferentes formas espaciais (endemia e epidemia) de manifestação de doenças geradas por microorganismos a medicina em sua ação preventiva busca atuar no espaço (além de atuar no campo propriamente médico) para conter as doenças.
Isso que chamamos de defesa geográfica contra as endemias e as epidemias: onde a doença é endêmica busca-se sanear o ambiente (rural ou urbano), tentando exterminar-se os agentes portadores e transmissores dos microorganismos.Quando esses agentes podem migrar e gerar uma epidemia, busca-se o controle das fronteiras, por exemplo: é esse o sentido de barreiras em estradas, por exemplo, impedindo que se transportem seres vivos, alimentos de uma região para outra.
São muitas as ações nessa direção e é por isso que pode ser dito que os médicos em suas ações contra os microorganismos acabam também sendo agentes organizadores do espaço geográfico.quarta-feira, 3 de março de 2010
NOVA YORK VENCE O CRIME?
sábado, 27 de fevereiro de 2010
Oriente Médio - velhos hábitos da nova geração
quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010
O que pode e para que serve uma CPI
Jaime Oliva
segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010
A ordem pós-segunda guerra
Jaime Oliva
As referências ao período do pós-segunda mundial não são apenas de celebração do fim de um conflito monstruoso que levou a morte e a infelicidade para várias dezenas de milhões de pessoas, atingindo diretamente e indiretamente mais de duas gerações de pessoas não apenas na Europa. Trata-se de um marco cujos desdobramentos, complexos por sinal, encontram-se na base da produção, mais do que uma nova ordem internacional, de uma nascente e inédita ordem mundial, algo que, nalguma medida, ultrapassa as relações convencionais entre nações soberanas.
O historiador britânico Mark Mazower apresenta a Europa do século XX como um perigoso laboratório de experiências sociais – como um continente sombrio[1], expressão incomum para referir-se ao continente que foi o berço da civilização ocidental e da democracia. De fato, o adjetivo não é exagerado por tudo que significou as guerras mundiais, a experiência nazista e a stalinista e as ações imperialistas noutros continentes.
sexta-feira, 29 de janeiro de 2010
As ambições do "planeta China"
Um primeiro aspecto importantíssimo a se notar sobre a grande transformação chinesa refere-se ao rompimento do seu isolamento geográfico, ou dito de melhor maneira: da ampliação de sua abertura para o mundo. No período em que a confrontação capitalismo e socialismo (cenário da Guerra Fria) possuía uma carga ideológica explosiva, esse país de regime socialista um pouco fora do modelo (com uma base camponesa superior à industrial) mantinha-se relativamente fora do cenário econômico internacional. Seu funcionamento econômico, sua economia planejada visava a auto-subsistência até onde isso era possível. S erá que o crescimento econômico assim obtido era compatível de ser comparado com os parâmetros de uma econômica capitalista aberta para o mercado internacional, para as necessidades de consumo do indivíduo moderno etc.? E agora com os novos vínculos estabelecidos, pode-se dizer que está havendo uma transformação estrutural, dada pelo rompimento do isolamento geográfico, logo por sua vinculação ao mercado internacional, às novas necessidades de produção a um novo espaço econômico, que caminha para ser mundial? Não se deve admitir, que mais que números a nova China ostenta novas relações com o mundo, aliás, as grandes responsáveis pelo vigor desses novos números? Contudo, uma questão importante se coloca: os bens chineses de exportação, que são sua grande força, não poderiam ser desenvolvidos e produzidos em grande escala, antes de tudo ao seu imenso mercado interno potencial? Em termos quantitativos resta alguma dúvida que o mercado interno poderia ser o dínamo inicial de processo? Mas, porque não é assim e só lentamente o mercado interno vai se constituindo (classe média ainda muito irrisória)? Será que não seria preciso uma grande transformação social interna para que sua população viesse a ser mercado? Transformação que deveria ir até o plano político? E que transformações concretas está havendo nesse plano? De um modo geral, pouco coisa. Logo, essa economia de mercado está sustentada inicialmente e principalmente numa realidade de mercado que é externa. Daí que a principal ocorrência da China moderna foi a incorporação desse externo à sua vida econômica.
As previsões econômicas assim como as políticas feitas por profissionais dessas áreas costumam ser facilmente desmentidas pelo futuro. Na verdade, essas previsões não têm pecado muito mais por prever a repetição do presente no futuro, logo por dizer em que não haverá futuro? O futuro não pode guardar realmente transformações? Por exemplo: o que se diz agora da China dizia-se do Japão. Havia até uma piada sobre um americano que dormiu durante vinte anos a partir do final da década de 90 e quando acordou lá por 2015 foi o centro de Nova York e perguntou quanto era o preço de um cachorro-quente e o vendedor disse: 1 yen. Tal seria o avanço japonês sobre o mundo, nessa era da globalização. Mas, não foi assim. Mesmo o Japão ainda possuindo uma economia sólida e de alta tecnologia (diferentemente da China) ela apresenta limitações. E entre essas, a principal é sua excessiva dependência do mercado externo, do espaço econômico que vai além de suas fronteiras. Será que o caso da China será o mesmo? Esse país não tem um espaço enorme para dentro para crescer? Mas que transformações serão necessárias para que isso ocorra? É possível esse país se transformar numa moderna sociedade de consumo (mesmo que em moldes próprios) com o tipo de relação política existente? Como liberar numa sociedade a criatividade existente, que depende de livre iniciativa, de liberdade de expressão e pensamento numa sociedade controlada da forma tão brutal com técnicas de terrorismo totalitário (vejam com atenção de novo, o caráter aleatório, surpreendente da “justiça” dos dirigentes. Isso não mantêm as pessoas em constante situação de medo e insegurança? Eis uma característica do terror). Sem a figura do individuo e dos direitos humanos poderá o bem-estar, que se associa em boa medida no acesso a bens de todos os tipos (o que é algo além do consumo banal, do consumismo), vingar num país como esse? O consumo, logo as dimensões do mercado interno, não ficará restrito a grupos privilegiados e ligados ao poder (e seus acólitos, seguidores acríticos)? Isso será suficiente para dar uma garantia interna ao crescimento econômico chinês? Ou todos as fichas continuarão investidas no espaço econômico externo? Isso não representará mais adiante crises inevitáveis nesse caminho, que acabarão derrubando os números da economia? Podemos afirmar que esse risco não existe? Afinal o mercado externo é tão estável assim? Vale a pena por fim tratar de um outro aspecto grave da questão dos direitos humanos, que como vimos não é apenas uma questão humanitária, pois ela terá certamente repercussões na questão econômico mais ampla. Por que as nações ocidentais (em especial os EUA) são mais tolerantes com a China e muito menos com outros países que apresentam problemas com os direitos humanos? A velha resposta dos interesses econômicos que vêm a frente serve aqui, mas precisa ser qualificada. No cálculo americano geopolítico (a política internacional que tem como base final a força militar) a China certamente representa menos perigo como parceiro econômico e político. No cálculo econômico mais ainda. O que representa Cuba nesses termos para os EUA? Não é exatamente o contrário? Sendo assim, não se sentem livres (assim como outras nações européias e ocidentais, Brasil incluso), mais à vontade, para debater as questões dos direitos humanos? Isso não é uma desmoralização para a humanidade, saber que nosso estágio civilizatório ainda é inteiramente dependente de interesses geopolíticos (o domínio militar, como meio de manutenção de hegemonia, é um horizonte projetado pelos “futuristas” para o futuro) e da lógica econômica? Por outro lado: não é uma cegueira não notar que o próprio horizonte econômico e estabilidade geopolítica estará ameaçada num futuro breve (ou mesmo agora) se outros valores não passarem a contar na vida das nações? Que não haverá chances de caminhar-se para qualquer coisa que se aproxime de uma sociedade (um conserto) mundial nessas condições?
quinta-feira, 28 de janeiro de 2010
Fé no punho
O (A) professor (a) para início das atividades pode inquirir seus alunos sobre o uso de bottons ou outros símbolos que eventualmente eles utilizam, como por exemplo, camisas de agremiações esportivas, ou de partidos políticos, movimentos sociais e até mesmos símbolos religiosos. Inclusive as tatuagens podem ser objeto dessa pesquisa. Uma lista dos símbolos e de seus significados (os declarados pelos usuários) pode ser providenciada na lousa. E quando o usuário não declarar nenhum significado, deve ser perguntado a ele porque usa o símbolo. Essa lista inicial pode servir como material interessante para visualizar-se quanto os significados e as razões do uso podem ser mais diversos e difusos do que imaginamos a primeira vista. Essa constatação, caso haja, deve ser bem notada para que em seguida os estudantes leiam a matéria no link indicado.
O que pode estar por trás do desejo de usar símbolos que originalmente foram criados para identificar os participantes e apoiadores de campanhas, de causas, de coletividades, sem que essa identificação exista? Não será mais do participar de qualquer coisa que está em pauta o desejo, em si, de se identificar e ser identificado? Alguns questionamentos e reflexões podem ser feitos visando explorar essa hipótese? Um fenômeno de muita visibilidade em nosso meio e que pode servir para traçar um paralelo com o tema da reportagem são as torcidas uniformizadas de equipes de futebol. A princípio, elas existem, para uniformizadas (a camisa é o símbolo) prestigiarem seus clubes nos dias de competição. Mas, não é segredo para ninguém que o uso desse símbolo ultrapassa essas funções originais. Não é fato que vem se desenvolvendo uma paixão superior do membro da torcida pelo seu agrupamento se comparada à paixão que ele possui pelo próprio clube e, mesmo, pelo esporte em si? Não é fato também que essas torcidas vem se transformando em agrupamentos sociais/comunitários que extrapolam suas atividades originais, ingressando em atividades de carnaval, por exemplo? Esses grupos não organizam pessoas que neles encontram um tipo de sociabilidade, uma coesão e identificação a uma coletividade, que de outra forma elas não possuíam? Não temos também notícias sobre as rivalidades (por vezes desdobrando-se em confrontos físicos) entre esses grupos, cuja razão está descolada da rivalidade esportiva e se associa muito mais a representações de fidelidade com o próprio grupo, tais como a valentia, a coragem, o sacrifício etc? Não é um típico caso no qual a representação (a torcida uniformizada de futebol) se desvinculou, de algum modo, do representado (o time do futebol) e passou a ser principalmente um grupo de identificação social, tal como, possivelmente, está acontecendo com os adolescentes que compram pulseiras para se identificar e serem identificados, utilizando a causa como pretexto (ou até desconhecendo-na), embora isso se dê de forma mais difusa, não tão clara? Não é provável que isso também esteja acontecendo de outras formas? Os diversos agrupamentos religiosos que proliferam em grande proporção nas grandes metrópoles brasileiras não estariam também respondendo, nalguma medida, a essa necessidade de pertencimento, de identificação social de indivíduos que vivem em situações de desagregação do tecido social? O cardápio de opções aos jovens, nesse caso, é múltiplo e variado e atende as diversas faixas de renda e também as diversas posições sociais em que se encontram esses jovens. Uma boa expressão que resvala nesse fenômeno talvez seja a de “rebelde sem causa”. Essa nos dá oportunidade de explorar algo muito afirmado contemporaneamente: diferentemente, por exemplo da geração de 1968, os jovens e adolescentes atuais formam grupos de identificação desfibrados, quer dizer: não são ligados à causas, são desideologizados, despolitizados etc. São coesionados por modas, por bens de consumo, controlados pelo mercado que “manipularia” em seu benefício a necessidade dos jovens pertencerem a algo, se rebelar, se identificar. Dessa posição, um pouco comum, pode se propor uma discussão em dois tempos: 1. De fato o jovem atual, apesar dessa necessidade social de pertencimento, é desligado de causas, e a única causa que defende é a sua mesmo?; 2. Por que no numa sociedade como a moderna esses símbolos de pertencimento (associados à moda, à causas, à necessidade de sociabilidade etc.) proliferam na proporção que notamos? Haveria uma insuficiência social nas relações cotidianas que facilitaria o surgimento de agrupamentos (mais ou menos difusos) comunitários, relativamente, apartados do todo social?
terça-feira, 26 de janeiro de 2010
A justiça é cega
Jaime Oliva
Moral, prática e ética: a organização do Estado moderno, forma básica de organização da vida no mundo moderno, pode ser apreendida em três dimensões: o Estado socioeconômico (a dimensão que atua diretamente nas questões materiais de provimento da sociedade); o Estado político (a dimensão que regula as relações de poder e cujo objetivo é a busca da legitimidade nessas relações); e o Estado de Direito (a dimensão que rege as relações sociais sob o império da lei, como alternativa ao uso da força e da violência como elemento regulador das relações sociais de todas as ordens). O Estado de Direito é a dimensão que implementa, expande e exercita a justiça. Mas o que é a justiça? Como ela se constrói? No que ela se baseia para se constituir nas sociedades modernas? A discussão aqui é longa, muita desenvolvida e complexa. Vale a pena sempre estudar isso, mas aqui queríamos destacar uma passagem, uma opinião bastante interessante do romancista entrevistado: ele é contra a pena de morte não por motivos morais, ou religiosos, e sim porque ela não funciona... “é desprovida de qualquer utilidade social”. E ele fala com conhecimento de causa, não só por ser advogado, mas por estudar o sistema jurídico e policial de uma sociedade que pratica a pena de morte. Não é uma suposição se vai funcionar ou não, como se faz no Brasil. Ele se baseia, certamente, em dados e estudos para afirmar isso. Mas da afirmação de Turow tiramos algumas questões fundamentais: 1. as leis, as punições para suas transgressões, o corpo geral de justiça deve ser erigido sobre preceitos morais (o que é certo ou aceitável, o que é errado e inaceitável segundo conjunto de regras e costumes – que inclui sua religiosidade - de um grupo social) ou sobre preceitos práticos (o que funciona ou não)? 2. Somente esse par (moral versus prática) resume a questão da constituição básica da justiça? Há uma questão básica para mostrar o quanto é problemática a construção das leis de modo exclusivamente vinculado a valores morais. Uma sociedade moderna, caracteriza-se, entre outras coisas, na emergência do indivíduo, elemento autonômo, com direitos totais de opinião. E com direitos de exercer seus valores morais, que podem não coincidir com de outras pessoas. Qualquer um de nós pode fazer listas de valores morais distintos em nossa sociedade em relação a praticamente tudo, desde a vida cotidiana e privada à vida pública. Na própria polêmica sobre a pena de morte no Brasil, notamos o confronto de posições cujos valores morais são opostos. Países nos quais as leis baseiam-se em valores morais extraídos de uma religião (em geral são extraídos de uma dada leitura das tradições da religião) costumam ter leis opressoras e injustas, em especial para aqueles que não seguem os preceitos daquela religião. Logo, se esses comentários são válidos as leis não podem basear-se num modelo de moral, visto que numa sociedade moderna podem existir vários, e todos possuem o direito de exercê-los. Num quadro assim o que é uma lei e uma “justiça justa”? O que é a verdade da justiça? Respeitar a diversidade de valores morais e não criminalizar a moral diferente é algo que o estado de direito moderno deve fazer e isso não é uma postura moral e sim ética e justa. Na verdade pode-se incorporar essa postura ética como um valor moral, mas ela é antes de tudo ética. Eis uma expressão chave para conduzir as reflexões: a ética. Turow não tem problemas morais quanto à aplicação da pena de morte, caso ela funcionasse, mas tem problemas éticos (que nele até viraram problema moral) contra a instrumentalização injusta dessa pena contra os negros americanos, tal como ele argumenta na entrevista, oferecendo alguns dados. Logo, é por meio do enriquecimento do sentido de ética que a discussão da justiça pode ser melhor encaminhada. A moral é mais estreita e inaplicável para toda a sociedade. A moral é mais tensa e emocionada, tem dificuldade de compreender o outro, e é mais vingativa e preconceituosa. Um exemplo interessante que pode ser apanhado da literatura, para fazer justiça à entrevista que é de um romancista, é o livro (que também virou filme) O Nome da Rosa. Nessa história pode ser ver a moral religiosa protagonizando uma imensa injustiça. A ética é mais prática e desapaixonada, busca a eficiência e reconhece o outro, sem ódio a princípio. Como funciona a justiça com base na ética: poderia ser argumentado que o respeito às diversas morais impede um padrão, uma justiça aplicável a todos. Vamos respeitar um agrupamento que resolve seus conflitos com violência, a partir de suas próprias leis? Não é melhor impor um único padrão de lei do que ter leis frágeis e pulverizadas que estão procurando respeitar e abraçar todos os direitos humanos e que acabam favorecendo os bandidos? Essas questões estão sempre presentes nos debates contemporâneos, em especial nos momentos em que violência e os crimes se multiplicam. Qual a solução ética para essas questões? Em primeiro lugar é preciso assinalar que diante da complexidade de situações, das rápidas e enormes transformações sociais, tecnológicas etc, das dificuldades imensas de convívio ainda existentes entre os seres humanos diferentes, das dificuldades operacionais da justiça, que a justiça, a correção e a verdade perfeitas são mesmo inalcançáveis, conforme opina Turow. Mas apesar disso temos necessidade dessa “justiça injusta”, que deve ser construída com determinados parâmetros: o corpo de leis não pode violentar os diversos direitos e morais. Logo, ninguém pode matar, porque isso ferirá valores morais presentes na sociedade (e se pertenço a uma sociedade tudo que nela ocorre me atinge de algum modo); o direito de usar a violência dentro de estritas regras será transferido para o Estado e será proibido seu uso nas relações sociais. O direito de julgar também. Só esses dois parâmetros demonstram que é possível um corpo comum que deve atender a todos. Não podem valer valores morais específicos que definem que uns têm mais direito às leis que outros. A ética incorporada no Estado não pode conter exceções. A compreensão dessa necessidade de abrangência para não ferir direitos diminui a intolerância quanto à própria prática da justiça. Não é uma intolerância achar que criminosos e bandidos não devem ter direito à defesa, nem direito a advogados etc? Aliás, a justiça praticada com ética e não com valores morais pulverizados é que define quem é bandido e criminoso. Não é melhor termos na mão uma justiça imperfeita em função de tudo que ele pretende equacionar do que uma justiça simples baseada numa moral simples, porém opressora e injusta com a complexidade humana.
Para assistir e refletir: Além do filme ou livro O Nome da Rosa há um filme interessantíssimo que passou nos cinemas brasileiros e na televisão, e que tem fitas disponíveis em locadores chamado Kadosh, que serve muito bem para discutir justiça, moral e ética: é uma história de religiosos judeus ortodoxos, na qual as mulheres tem pouca autonomia e se submetem aos hábitos e ritos religiosos protagonizados pelos homens. A transgressão é uma gravíssima falha moral e imperdoável. Num quadro assim a violência contra uma transgressão da mulher é uma consequência inevitável. Isso ocorre no filme, mas as leis éticas (laicas, sem base na religião) não permitem a violência. Os ortodoxos até lamentam numa cena que eles não tenham o poder político para impor suas leis a todos, quer dizer: sua moral. Esse filme contrapõem essas duas situações, e por isso ilustra bem um aspecto chave da justiça nas sociedades modernas.