quarta-feira, 14 de abril de 2010

Geografia dos cheiros

Jaime Oliva

A Geografia enquanto área do saber pode expor sobre as condições que favorecem a produção e emissão de cheiros nos diversos ambientes naturais e artificiais. Iniciando pelos ambientes naturais a grande variedade existente interfere na “Geografia dos cheiros”.
É preciso lembrar que nosso olfato é mais sensível a cheiros ruins (os cheiros mais difíceis de nosso olfato suportar são os que chamamos de ruins). Os cheiros em ambientes de predomínio de elementos naturais podem ser ruins? Os cheiros naturais não são sempre bons? Esse não será, inclusive, um dos motivos para valorizar a natureza em relação aos ambientes artificiais (o urbano e a cidade)?
A situação não é bem assim: cheiros ruins para o humano existem nos ambientes pouco transformados. Aliás, sua detecção serviu (serve) para anunciar situações de perigo, situações hostis ao homem. Erupções vulcânicas podem exalar gases venenosos, por exemplo. Regiões de mangue em zonas litorâneas também não possuem naturalmente cheiros agradáveis para os humanos.
Mas, a princípio, de um modo geral, os cheiros em ambientes naturais são agradáveis ou no mínimo suportáveis para o ser humano. Povos antigos, e grupos que ainda vivem de modo tradicional, que estavam mais próximos da natureza desenvolviam uma “sabedoria olfativa” como meio de importante de percepção de seus ambientes.
Pensando em macro-ambientes é possível fazer um certo “escalonamento” geográfico dos cheiros dominantes:
1. ambientes tropicais (não desérticos) pela presença bem maior de matéria orgânica combinada à insolação e umidade exacerbam o pútrido originário da decomposição de animais e plantas;
2. pode-se afirmar o contrário em relação às regiões frias (inclusive nas altas montanhas), que em geral são “regiões inodoras”. Assim, calor e frio (e outras condições climáticas) interferem muito no cheiro em ambientes naturais.
3. Outros ambientes terminam tendo cheiros típicos. Esse é o caso das regiões litorâneas: a combinação salinidade, mangue (onde houver), mais a matéria orgânica depositada nas praias e “costões” constitui um cheiro mais ou menos universal para esses ambientes (calor, frio e condições climáticas de um modo geral vão produzir variações).
No início do neolítico quando o ser humano começa a se sedentarizar, embora os ambientes ainda fossem dominantemente naturais, algumas “condições novas” vão significar cheiros “produzidos” pelo humano. O ser humano organizado em aldeias irá concentrar seus dejetos no entorno (nos cursos d’água, por exemplo); irá concentrar matéria orgânica animal proveniente da caça ou da domesticação de animais também nas cercanias dos aldeamentos.
Os cheiros anunciam não apenas o pútrido, mas a concentração de bactérias, os riscos de contaminação e disso tudo surgirá a necessidade de saneamento de ambiente. Uma medida foi a domesticar um animal saneador que por ser carniceiro eliminaria matéria orgânica: o cão, o melhor amigo do homem.
No mundo moderno a busca pela aglomeração dos humanos (seres sociais ciosos por contato) se consagrou e consolidou no mundo urbano, nas cidades. Espaços artificiais de concentração de gente, de múltiplas atividades, também se transformaram em espaços de concentração de matéria de todos os tipos, de resíduos químicos e orgânicos (gasosos, líquidos e sólidos) industriais, de lixo e esgoto domésticos, de emissão de gases combustíveis etc.
Essa concentração de matéria, de matéria a ser descartada inclusive, se constitui numa fonte para a produção de cheiros, por vezes intensos. Alguns chegando mesmo a se tornar problemas ambientais (poluição atmosférica difusa que tem odor mais ou menos suportável; cheiros exalados de cursos d’água muito poluídos etc).
As cidades são assoladas por cheiros mais ou menos intensos dependendo de vários fatores. O principal se refere às condições de saneamento; outro fato importante é o meio de circulação (muitos automóveis ou marcha pedestre e transporte coletivo); nível de arborização, as condições climáticas etc.
O certo é que de um modo geral podemos opor os cheiros do urbano com os cheiros dos ambientes naturais, com desvantagem para os cheiros urbanos, pelo menos é o que diz nosso olfato. Se há uma distribuição ambiental dos cheiros mais ou menos apreensível, é possível exercitar o sentido olfativo para perceber os ambientes.

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