sábado, 27 de fevereiro de 2010

Oriente Médio - velhos hábitos da nova geração


(o que segue é uma sugestão de aula)
Jaime Oliva
Países como Marrocos, Síria e Jordânia abrigam sociedades cuja boa parte de seu funcionamento ainda é regida conforme as características básicas das sociedades tradicionais. Se compararmos esse tipo de sociedade com o que caracteriza as sociedades modernas vamos notar diferenças radicais.
Num mundo em que predominam as sociedades modernas, cuja dinâmica ainda permanece, as sociedades tradicionais costumam ser avaliadas como "atrasadas". Mas, o que interessa discutir, é como podemos conceituar uma sociedade tradicional e ao mesmo tempo compreender as dificuldades existentes para ela se transformar, pois mudanças dessa importância são sempre dolorosas.
Olhando do Brasil, país em que o "processo de modernização" está mais avançado, a nossa tendência é achar que esses países do Oriente Médio, que ainda vivem numa certa medida da forma tradicional, representam um mundo estranho e incompreensível. Isso não é verdadeiro. Nossa proximidade com eles é maior do que parece, isso porque há algumas dimensões na vida brasileira que funcionam ainda de modo tradicional.
Ademais, o processo histórico de modernização do mundo ocidental ainda é recente: quer dizer, estudar nosso passado de certo modo é estudar as sociedades tradicionais. Logo, para interpretar as ocorrências atuais desses países é importante se municiar de alguns conhecimentos conceituais básicos de funcionamento das sociedades tradicionais e das sociedades modernas.
Essa é uma preparação básica para uma aula de geografia para que a análise ultrapasse a estranheza e seja mais profunda e compreensiva. Seria importante por meio de mapas o professor mostrar não só a localização desses países e suas condições naturais, mas sua relação com os vizinhos (em especial Israel).
Com outros materiais e mesmo por meio de exposição do professor contextualizar a situação geopolítica desses países – os conflitos com o mundo ocidental protagonizado recentemente pelo Iraque e em outro momento pela Líbia; o conflito palestinos e Israel; os conflitos no Líbano; a questão do petróleo, etc. Uma visão histórica da relação desses povos com o Ocidente também seria interessante.
O que se pede aqui é que não se parta diretamente para a discussão sem que algum conhecimento prévio sobre a região exista.Países como Síria, Marrocos e Jordânia estão sofrendo um lento processo de transformação mais ou menos em direção a valores da modernidade. Esse processo tem sido doloroso por que as resistências da tradição são enormes.
Essa resistência ainda é maior porque os agentes modernizadores internos, tanto quanto seus aliados externos (no mundo ocidental) não têm conduzindo suas ações de modo a mostrar as vantagens da transformação. Um caso marcante disso ocorreu no Irã onde um membro da nobreza local o Xá Reza Palevhi impôs uma modernização abrupta no plano da economia, beneficiando parte inexpressiva da população e ignorando o plano da política no qual ele reinou ditatorialmente, ocasionando uma revolta muito grande contra o mundo ocidental e fazendo ressurgir naquele país um estado funcionando em associação com a religião, traço marcante das sociedades tradicionais.
Elementos das sociedades modernas no Oriente Médio: a estruturação de países com uma estrutura estatal que possuam ministérios técnicos (relações exteriores, economia, agricultura, indústria, saúde, etc.) e outras instituições representam um aspecto da modernização, e isso, embora de modo incipiente está presente nesses países, o que demonstra que existe, ao menos em parte e no plano da gestão técnica e econômica, um processo de modernização.
Caso contrário como esses países esperariam receber investimentos estrangeiros para mover suas economias? Isso seria possível sem ajustar o funcionamento de suas economias aos moldes do mercado mundial, cujas regras de funcionamento são modernas?Será que o avanço da modernização necessário no campo de economia exigirá que em outros aspectos esses países de modernizem, por exemplo, democratizando o poder político e concedendo direitos iguais aos homens para as mulheres?
Ou os interesses econômicos mundiais podem perfeitamente adaptar-se a essas estruturas de poder tradicional (a reportagem fala em transmissão do poder por hereditariedade). Por exemplo, o mundo capitalista moderno encontra muita dificuldade para negociar com a China onde o poder político é ditatorial, embora não de tipo tradicional?
Tomemos o caso de algumas figuras políticas recentes como as ex-governantes de dois países que também vivem situações de convívio conflituoso entre o mundo moderno e o mundo tradicional – o Paquistão e a Índia. Estamos nos referindo a Bennazir Bhutto no Paquistão e a Indira Gandhi na Índia. Nesses dois países predomina uma condição da mulher que é de subalternidade tanto na vida privada quanto na vida pública (onde sua participação é inexistente).
Como explicar então a presença dessas duas mulheres no poder máximo desses países? Seus pais foram governantes e o valor da hereditariedade pesou. Mas terá só sido isso? Como explicar a reação negativa das mulheres às mudanças propostas pelos jovens governantes? Haveria algo semelhante em nossa sociedade? O que é moderno, o que é tradicional: pode-se obter uma melhor compreensão sobre o que é uma sociedade tradicional tendo em conta o presente da expansão das sociedades modernas.
O termo moderno, em nossos dias, é muito usado. Parte de seu conteúdo original perdeu-se. Quando o usamos referindo-nos a uma sociedade qualquer, ou a partidos políticos, ou a comportamentos individuais ou sociais, passamos uma impressão positiva, como se essa expressão fosse um adjetivo que se opõe a antigo, atrasado e superado. Mas, o sentido conceitual dessa expressão não é esse. Sociedade moderna é uma forma de sociedade.
Vivemos uma época de predominância desse tipo que se refere ao estilo, aos costumes ou organização social que emergiram na Europa a partir do século XVII e que vem transformando mais ou menos mundiais em sua influência. E sobre que tipo de sociedades as sociedades modernas vem se impondo? Sobre as chamadas sociedades tradicionais.
Essa última expressão passou a ser usada em larga escala pelos estudiosos para designar sociedades que possuíam certas características das quais vamos enunciar algumas que vão nos ajudar a entender melhor o que ocorre na Síria, Marrocos e Jordânia:
Poder político legitimado (validado) por tradições culturais – mitos, religiões e hereditariedade: esse foi o caso das várias formas de monarquia absolutista. Eis uma opinião de um historiador importante: “A meu ver a Revolução Francesa e os feitos de Napoleão abriram os olhos do mundo. Antes as nações não sabiam nada, e as pessoas pensavam que os reis eram deuses sobre a Terra e que tinham que dizer que tudo que eles faziam era bem feito”. (Eric J. Hobsbawn)
Poder político centralizado, com formas razoavelmente avançadas de organização estatal, e apoiado em relações aristocráticas, em que as possibilidades de representação política do indivíduo estão praticamente ausentes. Em comparando essas duas características políticas com as sociedades modernas veremos que nestas últimas o poder político não é mais legitimado pelo fato do governante pertencer a hierarquia da religião dominante ou a família real, independentemente de suas qualificações pessoais.
Nas sociedades modernas o governante disputou o poder por meio de processos políticos impessoais, com regras políticas com base na representação, partidos políticos, tudo isso independentemente de seu grau de parentesco com a nobreza ou de sua posição em qualquer estrutura religiosa. Também nas sociedades modernas a população tem peso na escolha de seus governantes por meio do processo eleitoral.
Bibliografia GIANSANTI, Roberto & OLIVA, Jaime. Espaço e Modernidade; temas da geografia mundial. São Paulo, Editora Atual, 1996.

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