sábado, 7 de junho de 2008

A perpetuação do presente: o sonho fechado em torno do condomínio

Jaime Oliva

Faz sucesso econômico nas cidades médias do interior do estado de São Paulo (e também em outros estados) os empreendimentos imobiliários de algumas empresas que se especializaram na construção de condomínios, inclusive de versões mais populares. Este fenômeno também é notável nas grandes cidades; essas vivem processos de reestruturação urbana que têm como núcleo esse modelo de moradia. A princípio esse fato pode parecer algo que interessa apenas à economia, mas seus desdobramentos implicam numa série de elementos que repercutem gravemente sobre a realidade urbana atual do Brasil. Esses elementos merecem reflexão, porque estão dando o tom do desenvolvimento de nossas cidades, como se fossem naturais as tendências que eles alimentam, como se fossem sem conseqüências, como se não fossem escolhas que devem ficar explícitas para que os cidadãos sejam de fato atores sociais, e optem ou não por eles. Um dos elementos a ser considerado é a naturalização da casa própria, algo visto como a única solução legítima para resolver a questão da moradia. Outro é o modelo do condomínio fechado como uma forma de moradia ideal, que acalenta sonhos de famílias mesmo em cidades menores. Por que se sonha com isso, não é algo óbvio e muito menos sem efeitos. As discussões que sugerimos a seguir vão investir numa problematização dos efeitos urbanos que esse modelo reportado de casas populares pode trazer para nossas cidades. Vão investir na desconstrução da naturalização que cerca os fenômenos que marcam a realidade da dinâmica urbana. Afinal tudo que nos rodeia é fundamentalmente construção humana, e essas construções são valorizadas conforme o contexto cultural, social e político de cada época. Logo tudo pode ser questionado e repensado, algo que nem sempre pode se fazer com o que é natural; por que se discutir a pertinência do sonho da casa própria se é algo natural, que todos desejam e precisam? Mas e se não for, e se existirem meios, que conforme a situação, solucionam bem a questão da moradia, não seria o caso de se considerar? Aliás, é assim com tudo. Naturalizar fenômenos sociais congela a história, impede a construção de alternativas.

O preço das moradias: várias são as reportagens na imprensa que se referem a ascensão de vários milhões de brasileiros que estão migrando das classes sociais de baixa renda para as de média renda, que chegam a uma renda mensal de cerca de 3.500 reais. E que esse segmento pode ter agora casa própria. É importante lembrar que o valor da renda sofre uma inflexão geográfica, pois esses 3.500 reais valem diferencialmente conforme a cidade e sua localização. Valem mais numa cidade média do que numa metrópole. Uma renda assim pode dar acessibilidade à casa própria numa área bem localizada das cidades médias e o mesmo não pode ser dito se a referência for uma grande cidade, onde terrenos e edificações são mais valorizados. Recentemente uma reportagem (http://veja.abril.com.br/040608/p_162.shtml) se referia uma empresa de sucesso que constrói e comercializa casas são pré-moldadas populares, porém situadas em condomínios fechados. Elas possuem 70 m2 de área construída o que, convenhamos é minúsculo. Os cômodos são necessariamente muito pequenos e uma casinha assim está longe de ser confortável. E o preço? 85.000 reais. Será barato numa cidade do interior? Não é não. É possível comprar casas maiores em bairros das cidades grandes por esse preço e isso qualquer pesquisa simples pode demonstrar, embora não serão imóveis bem localizados. Esse preço elevado está sendo cobrado por algum motivo suplementar e o acréscimo se dá com a inclusão de um capital simbólico: o condomínio. Vale refletir sobre isso.

Os condomínios fechados, a valorização dos imóveis e o sonho da casa própria: nas grandes cidades, em especial em São Paulo e no Rio de Janeiro, há 25 anos assiste-se uma reestruturação urbana muito profunda cujo personagem principal é um estilo de moradia: o condomínio fechado vertical e horizontal. Atualmente ele está naturalizado como uma forma óbvia e ideal de moradia, mas ela não existia, trata-se de fenômeno recente. Como são os condomínios? São torres de apartamentos ou coleções de casas horizontais fechadas em espaços protegidos das ruas; possuem guaritas e segurança que vigia e fiscaliza os freqüentadores. São formas de moradia que se relacionam mal com as cidades, que de certa forma negam a cidade, afinal se protegem do quê? A principal alegação nas grandes cidades para a explosão imobiliária com base em condomínios é a segurança, mas a partir dessa representação se transformou numa forma de moradia que segrega e alimenta visões de status. Não é verdade que morar em condomínio dá status? Por que sonhar em morar em condomínio e não sonhar com a solução dos problemas de segurança que certamente diminuíram com um incremento, que insiste em não ocorrer em nosso país, de justiça social? O que ocorre é que esse estilo de moradia se naturalizou e por isso virou sonho, virou representação de futuro, de ascensão social. Afinal nas cidades médias e pequenas do interior têm os mesmos problemas de segurança que as grandes cidades? Mas, não parecem que estão imitando o modelo que proliferou nas grandes cidades? Morar em condomínio numa cidade do interior não tem essa justificativa, mas se transformou em febre nas cidades do interior de São Paulo. Há casos de quem abre mão de casas boas nas regiões centrais das cidades e vão para as periferias de terrenos grandes e baratos que serão recortados ao extremo pelo empreendedor para fazer cubículos de 70 m2 e bem caras, que ainda produzem o efeito colateral de estarem afastadas dos principais recursos das cidades. Mas que recursos? Afinal uma das lógicas do condomínio não é o isolamento da cidade? Não se pode afirmar que as pessoas estão pagando caro para “fugir” das cidades, e se afastando delas não estariam contribuindo para piorar as condições dos centros urbanos? E por que necessariamente as pessoas têm que comprar casas? Pela lógica especulativa trabalhada pelo setor imobiliário quanto menor a renda menor a casa e pior localizada (o sonho do condomínio eliminou de vez a preocupação com a localização)? Vale a pena morar nas periferias, isolados em condomínios, afastados da urbanidade, para realizar o sonho da cada própria? Por que o aluguel, que pode nos dar acesso a melhores imóveis e mais bem localizados é tratado em nossa sociedade como uma deformidade e como dinheiro jogado fora? São questões polêmicas, mas o importante é que elas sirvam para desnaturalizar os modelos habitacionais e construir um senso crítico maior, para inclusive não facilitar ações especulativas e contra o consumidor das empresas imobiliárias. E principalmente: para que os cidadãos sejam de fato cidadãos que pensem em suas cidades e saibam que suas opções individuais são elementos construtores da cidade que habitam. E que eles devem trabalhar para ter alternativas e não apenas seguirem tendências pouco pensadas que surgiram agora e que parece que sempre estiveram aqui e em todos os lugares do mundo, o que não é real.

Um comentário:

Trio eletrico disse...

Parabens pelo blog
muito bom
Gostaria que conhecessem esse site achei bastante interessante
www.casasgranjaviana.com