terça-feira, 25 de novembro de 2008

A “fabricação” geográfica de lugares turísticos

Jaime Oliva

Rémy Kafou e Mathis Stock são dois autores que vem produzido obras importantes e originais sobre a relação geografia e turismo. Suas elaborações escapam a mesmice ao abordar o fenômeno turístico como um efeito complexo da ampliação da mobilidade humana e também como decorrência da construção moderna da figura do indivíduo. Diferentemente dos estudos convencionais sobre o turismo, os autores buscam sua compreensão considerando a espacialidade (dimensão que se recria com as novas mobilidades) e o papel dos atores sociais (que uma abordagem que considera o indivíduo não negará). A seguir vamos expor alguns pontos que podem iniciar a organização de um discurso sobre a relação turismo e geografia tendo essas referências mencionadas.
Atores sociais: percebê-los ajuda a compreender melhor o fenômeno turístico: 1. os turistas estão na origem do turismo, isso é óbvio, mas não é considerado suficientemente. Os novos lugares abertos para o turismo têm nos “atores turistas” seus desbravadores, como por exemplo, os praticantes do ecoturismo, que buscam o ineditismo e que por meio de suas práticas turistificam lugares. Nesse caso, novos espaços turísticos não são produtos da ação do mercado; 2. o mercado é outro ator: atua colocando produtos turísticos para depois atrair turistas. Criação de áreas turísticas, a abertura de atrações, a divulgação na mídia etc; 3. Planejadores e promotores “territoriais”. Esses últimos muito mais ligados ao espaço a ser turistificado: governos que produzem atrações nas mídias, nas novelas, por exemplo. Ou, então, que lutam por tombamento, por decretação de áreas como parques etc.
Algumas questões da turistificação dos lugares: quais as relações turismo e espaço? Podem existir espaços sem turismo, mas cada vez menos. O turismo se organiza em configurações espaciais distintas: territórios e redes geográficas (formas espaciais que contornam os territórios). Nos territórios o turista e sua ação são prevalecentes; nas redes geográficas o mercado e os agentes dominam os turistas. As práticas turísticas podem ser condenadas? Essa condenação tem origem no preconceito? Muitas críticas têm origem no preconceito, por mais que não se possa negar que de fato há situações condenáveis. Mas, elas não são suficientes para justificar a carga que se atribui ao turismo.
O turismo para as cidades: as grandes cidades atraem os maiores fluxos turísticos e têm sido o principal reduto do “turismo de massas”, embora nesse último aspecto sofram a concorrência crescente do turismo voltado para o binômio sol/praia. As cidades atraem por quê? Antes de tudo pelos atributos de ser cidade: a riqueza de seus monumentos históricos ou arquitetônicos, paisagens populares ou românticas e seus grandiosos recursos culturais. A esses fatores tradicionais acrescentam-se novos: exposições, congressos, eventos culturais e desportivos que alcançam uma grande difusão internacional. As cidades têm várias situações estratégicas para atrair os turistas: as infra-estruturas de comunicação e de transporte partem e se dirigem para as cidades; concentração de recursos de hospedagem, de comércio, mercados populares e “étnicos”, parques temáticos etc.
Recursos turísticos das cidades: 1. Patrimônio histórico: por que esse patrimônio exerce fascínio? Uma bela frase talvez diga tudo: “o passado é país estrangeiro” (Peter Hall). Há organismos que legitimam certos conjuntos como patrimônio cultural (Unesco e IPHAN, por exemplo). Salvador, Recife, Brasília, Olinda, Ouro Preto, São Luís e Goiás estão na lista de patrimônio histórico da humanidade. 2. Regeneração para o turismo de áreas degradadas: nas principais metrópoles há uma febre de regeneração de áreas abandonadas e decadentes. Mais de U$ 50 bilhões estão sendo investidos em quase 100 grandes centros da Europa e dos EUA nesse processo de cirurgia estética urbana. Roterdã e Hamburgo estão transformando a região portuária em bairros modernos. A Inglaterra pretende gastar até 2009 U$ 4 bilhões em 39 áreas degradadas de suas maiores cidades. O turismo é uma das ferramentas utilizadas para dar atividade econômica a esses centros renovados; 3. Megaeventos: atualmente as cidades competem entre si para sediar megaeventos. Acontecimentos artísticos (festivais musicais e de cinema), religiosos, científicos e esportivos (Olimpíadas, Copa do Mundo etc). Isso sempre traz ótimos resultados turísticos. (voltaremos em outro pequeno artigo ao tema da relação geografia e turismo)
Indicação bibliográfica
Mathis STOCK. Mobilités géographiques et pratiques des lieux. Étude théorico-empirique à travers deux lieux touristiques constitués: Brighton & Hove (Mobilidades geográficas e prática dos lugares. Estudo teórico-empírico através de dois lugares políticos constituídos). Tese de Geografia, defendida na Universidade de Paris 7.

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