sábado, 22 de novembro de 2008

Crise no ensino superior privado

Jaime Oliva

Quando se fala em crise no ensino superior privado no Brasil fica presumido um reducionismo que diz respeito apenas à crise de sustentação financeira, algo que afeta a estabilidade institucional. É uma redução porque a crise está presente em várias outras faces das atividades nesse setor da educação brasileira. Mas, ficando somente no plano da crise de sustentação ele se relaciona obviamente com a queda do estoque disponível de candidatos a ingressar no sistema. Essa queda é real, se manifesta inclusive na universidade pública, mas é complexa, pois se relaciona a vários fatores, nem todos presentes, ao menos da mesma maneira, nas diversas regiões do país. A grosso modo, poderíamos relacionar quatro fatores responsáveis pela queda:

1. Mudança demográfica: o declínio constante da taxa de fecundidade no país, que agora chega a níveis dos países europeus. Isso após uma permanência durante um bom tempo em topos elevados. A linha descendente da taxa fica nítida após os anos 1980, e certamente está relacionada a um conjunto importante de mudanças na estrutura geográfica, que compõe o todo social, do país (urbanização), na estrutura social (ascenção do individuo com figura significativa no conjunto o que implica numa outra condição feminina). O quanto desse declínio já afeta os estoqes de candidatos jovens ao ensino superior logo será calculado, mas evidentemente vai afetar e isso será duradoro, visto que o Brasil está vivendo uma transição demográfica irreversível.

2. Mudança da taxa etária média: a partir dos anos 1970, todos sabem, abriu-se um volume extraordinário de vagas no ensino superior privado. Na verdade, oferece-se a esse setor nascente a chance explorar uma enorme demanda reprimida que o ensino superior público, pela escassez de vagas e de recursos não conseguia atender, numa época que a economia e a sociedade se transformavam. O público que formava essa demanda reprimida já havia passado da idade padrão de ingresso no ensino superior, e estava com seus estudos interrompidos. Logo, o novo setor crescente do ensino superior privado investiu nesse público alvo que preencheu um número elevado de vagas no sistema nesses últimos 20 anos. Além disso, por se tratar de um público mais adulto e, de um modo gral, estabelecido no mercado de trabalho, havia renda segura para o pagamento das mensalidades. Naturalmente esse estoque não podia ser eterno, e está por findar. Atualmente a faixa etária média no ensino superior já diminuiu bastante. e boa parte dos jovens tem ainda inserção instável no mercado de trabalho e dificuldades para manter suas mensalidades em ordem.

3. A questão do fluxo escolar: o indíce de retenção do fluxo escolar é um elemento a ser considerado, embora nem sempre ele seja colocado na cena pública. É um medidor da qualidade do sistema escolar, em especial no ensino básico. Quanto maior esse indíce de retenção (queda na velocidade) pior o quadro escolar. Quanto mais lento menor o estoque de candidatos a ingressar no ensino superior, em especial no sistema privado, visto que seu público em potencial vem do ensino médio público, e justamente nesse segmento parece haver um aumento do indíce de retenção do fluxo escolar. É terrível a crise do ensino médio, em termos de desempenho e certamente, a evasão (mesmo que transitória) e a repetência refletem essa crise.

4. Concorrência degradante: uma concorrência insandecida pelo estoque em diminuição leva as empresas e fundações envolvidas (essas últimas menos) a ações incompatíveis com a atividade educacional (a lógica econômica e as instituições de ensino não se harmonizam naturalmente). A principal ação tem um viés econômico isolado: ataque à qualidade construída, em razão dos seus custos, para a obtenção do rebaixamento dos preços das mensalidades. O que vai acontecer a partir daí é um declínio qualitativo insuportável de algo que já não era digno de orgulho. Ocorre que o público potencial para o o ensino privado tem renda limitada e o apelo do custo mais barato num ensino, que é privado, será particularmente sensível, e por outro lado esse mesmo público não teve acesso a recursos críticos, e está pouco gabaritado para julgar o que isso significa em termos de sua formação. Daí que essa forma de concorrência diminui o público para instituições que não realizaram a reengenharia (ataque aos custos da qualidade) e que cobram mensalidades mais caras.

O quadro é grave para o setor. Poderia se defender que: - se ajustem, se moldem ao mercado, fechem se necessário. E é isso que talvez terminará acontecendo com várias das instituições. Mas é sempre bom lembrar que o sistema privado de ensino superior é reponsável pelas vagas de ao menos 70% do público estudantil brasileiro, entre outras razões porque o sistema público não possui vagas suficientes. E é um absurdo que um setor com essa responsabilidade permaneça oscilando, ora progredindo ora se degradando, quando seus "clientes" são brasileiros em formação que não podem viver em meio a essa instabilidade. Essa adicionará mais problemas na construção intelectual e profissional desses estudantes que não podem continuar sendo tratados como "sobra social."

Um comentário:

Unknown disse...

Olá Dr. Jaime Oliva,

Parabéns adorei o site, tem muitas informações importantes para mim que estou desenvolvendo TCC na área de economia,tema: Crise economica, o que isso afeta na educação superior?, gostaria se possivel de ler mais texto sobre esse tema...Obrigada,
Thelma.....e-mail: thelma_201@hotmail.com