domingo, 18 de maio de 2008

China: da pobreza para riqueza ou da riqueza para a pobreza?

Jaime Oliva

A China desperta interesse não somente em razão da incrível transformação pela qual passa esse país, mas também por restaurar um debate apaixonante sobre que modos de vida devemos construir, quais os melhores, de quais devemos fugir etc. Seguramente, esse debate foi mais intenso por ocasião da Guerra Fria (a partir de meados dos anos 1950) cujos protagonistas eram EUA e URSS e que tinha como pano de fundo um confronto ideológico entre o capitalismo e o socialismo. O denominado socialismo fracassou, caiu o muro de Berlim, a URSS ruiu e a China se transformou de modo peculiar: ingressou numa economia de mercado capitalista mantendo uma estrutura de poder cujo núcleo é um único partido, na verdade o velho partido comunista chinês, que teve em Mao Tsé Tung seu grande líder histórico. Teria o capitalismo, assim, vencido, e o que acontece agora na China é uma prova cabal disso? Mas não é nada surpreendente que se encontre muita gente bem informada que discorde frontalmente dessa visão. O debate sobre os modos ideais de vida perderam intensidade, mas não se encerraram. Se os fatos são tão incontestes como podem haver discordantes, seriam apenas cegos?


Como descrever a realidade da China atual de forma a convencer de seu sucesso aqueles que vêem no socialismo (e a China foi um dos modelos preferidos) um horizonte desejável para as sociedades? Se são portadores de valores diferentes sobre o que ser humano deve ser, terão o mesmo entusiasmo ao observar a dinâmica atual da sociedade e da economia chinesa? E o contrário? É bom que se saiba que nos anos 1960 até mais ou menos 1980 muitos viajantes brasileiros, simpatizantes do socialismo, e mesmo algumas pessoas de traço político pró-capitalismo, visitavam a China e mesmo que não gostassem do regime, voltavam afirmando ser inegável que a China havia superado uma fome centenária, que havia ordem, cidades organizadas e limpas, educação universal, embora tudo isso, sem nenhuma forma de economia de consumo e com uma rígida divisão dos recursos e um controle político férreo e implacável. Não havia riqueza, mas não havia pobreza, era o que se dizia. Porém, os que há pouco tempo eram chamados de neoliberais afirmam que a China atualmente vem saindo de um quadro de miséria, reformando cidades que eram sujas etc. Sair desse impasse interpretativo é uma questão chave para qualquer estudante. Verificar quais são as interferências nesse debate é algo que deve ser exercitado bastante, como meio para avançar nas reflexões.

O que é pobreza, miséria etc.? Algo que nos parece assim tão óbvio pode suscitar dúvida. Ao observarmos nossa realidade não temos muita dúvida do que é pobreza. Porém, ao observarmos realidades muito distintas da nossa teremos a mesma certeza do que é pobreza e miséria? Vamos pegar um caso extremo: uma comunidade indígena brasileira que ainda pratica em suas terras formas tradicionais de vida tem acesso a bens de consumo? Serve-se do mercado para se abastecer? Relaciona-se com povos de localidades distantes? Tem computador, energia elétrica, automóveis, etc? Pela ausência desses bens poderão ser designados como pobres? Falando da China de passado recente (economia socialista), não se pode aplicar em alguma medida o mesmo raciocínio? Não foi aquela uma sociedade que tinha como proposta uma economia coletivazada, com centralização dos recursos na mão do estado, que implementava planos, que tinha objetivos e que se definia como uma sociedade que não dependia do mercado? É claro que nada disso pode ter funcionado (aliás, funcionou muito mal). Mas caso tivesse funcionado bem, mesmo assim não teríamos naquele tipo de sociedade baixo nível de consumo, que é um indicador muito utilizado por nós para definir o que é pobreza? Nada disso quer dizer que o nível e o tipo de consumo não possam ser um elemento válido para se medir a pobreza e a riqueza, mas isso é relativo à forma social adotada. Não seria esse um argumento que serve para mostrar os cuidados que temos que tomar nas discussões. Não faria muito mais sentido opor as coisas de outro modo, por exemplo: o bem-estar de uma sociedade pode depender em que medida do consumo? Isso é muito diferente do que fazer coincidir de uma forma naturalizada consumo = riqueza, ausência de consumo = miséria. Refletir sobre isso, a luz do que acontece na China, por exemplo, é muito produtivo. Há algo na China atual que nos indica a complexidade e não a obviedade da situação: é comum afirmar-se que uma das grandes forças econômicas da China é sua imensa e baratíssima mão de obra o que torna os produtos chineses muito baratos no mercado global. Isso não quer dizer que esses trabalhadores recebem baixos salários e tem potencial limitado de consumo? Eles não poderiam ser chamados de pobres? E eles são centenas de milhões?

A transição do socialismo para o capitalismo: uma reflexão interessante seria sobre a transição que está se dando na China. Como era o socialismo chinês que agora está superado por um novo tipo de economia? Por que há tanto espaço para crescimento da produção econômica e do consumo? Não é, certamente, somente pelo tamanho da população (aliás, no caso chinês todos dizem que possuir essa população imensa é sua força, e o mesmo não serve para outros países populosos)? Vamos pegar um exemplo: tem-se conhecimento de um aumento expressivo de viagens internas por avião? Esse é um indicador forte de dinamismo econômico e de qualquer tipo de economia? Na China socialista não havia economia de mercado. Uma imensa maioria da população era ainda rural (aliás, vale verificar qual a urbanização atual da China, pois esse é um indicativo de transformações profundas na vida sócio-econômica do país, visto que o grau de atividade imobiliária nas cidades) e tinha produção local quase que auto-suficiente. As regiões chinesas, mesmo as áreas urbanas, segundo o planejamento, deveriam buscar o máximo de auto-suficiência. Isso não significa, por consequência, uma baixa circulação nos transportes de pessoas e de mercadorias? Isso não significa que a rede de transporte não precisa ser tão desenvolvida? Adentrando-se agora numa economia de mercado, a situação se inverte: a produção para o mercado combina com buscar a auto-suficiência local? Ou o contrário? Não seria a adesão à economia de mercado um dínamo da relação entre as regiões e entre as cidades chinesas? O socialismo chinês era de povoações isoladas, pouco conectadas, de um povo mais ou imóvel? Haverá quem defenda que isso é melhor? Haverá. Eis uma boa discussão: sem dúvida a economia de mercado estimula o contato, a conexão, as trocas, as ligações entre os vários lugares (chegando até a escala mundial). Uma economia de tipo socialista pode prescindir sem grandes prejuízos, como a chinesa prescindiu, das conexões? Relacionar-se, conectar-se, trocar bens e valores não é um valor humano para todos? Por fim, compreender como era a China e qual o perfil da transição é um estímulo para enfrentar a complexidade da questão. Discussões que não naturalizam a priori a realidade costumam ser menos conclusivas, porém mais próximas da realidade, ao contrário, de visões simplistas, apaixonadas, de “simpatizantes torcedores” de dois eternos rivais naturais, que escolho sem saber porque: o capitalismo e o socialismo.

2 comentários:

Soninha Francine disse...

Sensacional! Poderíamos passar um ano inteiro só discutindo os conceitos de pobreza, riqueza, autosuficiência, mobilidade... Muito boa reflexão, adorei.

Unknown disse...

eu como aluna comversor quer meu professor de geografia escolheo um enselente país e claro quer esse país se chama china
eu vir quer ele um dos países mais ricos do comtinente ele sim dever se elogiado como país mais rico principalmente por causa da educação.